ORIENTAÇÕES PARA O TRABALHO DE CAMPO

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ORIENTAÇÕES PARA O TRABALHO DE CAMPO
Renato Veloso


O projeto de pesquisa, “TECNOLOGIAS DA INFORMAÇÃO A SERVIÇO DO SOCIAL: UMA ANÁLISE DO SEU POTENCIAL PARA A GESTÃO PÚBLICA” realizado na Faculdade de Serviço Social da UERJ e financiado pelo CNPq, tem por objetivo conhecer as modalidades e formas de uso de tecnologias da informação na gestão pública, a partir das informações fornecidas por assistentes sociais, enfatizando o seu potencial para a melhoria dos processos de planejamento e implementação de políticas públicas. Busca verificar se a incidência de uso de tecnologias da informação ocasiona melhorias efetivas na gestão pública, como a ampliação de direitos e o aperfeiçoamento das instituições democráticas, ou se, simplesmente, prioriza um padrão adequado às necessidades do capital, tomando as tecnologias apenas como ferramentas de racionalização do trabalho e de gerenciamento.

Visando apreender as formas de incorporação das TI aos processos de trabalho em que se inserem os assistentes sociais (detectando dificuldades, limites e desafios postos às equipes e aos profissionais ), foram definidos como instrumentos de coleta de dados a entrevista, a observação e o diário de campo. As orientações a seguir têm por objetivo subsidiar o trabalho de campo, apresentando sugestões para que as entrevistas, observações e registros em diários de campo sejam conduzidos da forma mais consistente possível.

A entrevista tem por objetivo apreender o ponto de vista dos entrevistados, por isso não deve haver preocupações com respostas “certas” ou “erradas”. O que se quer apreender dos entrevistados são dados subjetivos que só podem ser obtidos com sua contribuição: atitudes, valores, opiniões, maneiras de pensar, sentimentos, maneiras de atuar, condutas, comportamentos presentes ou futuros e suas razões conscientes ou inconscientes.

O roteiro de entrevista é um guia, e não um obstáculo. Isso significa que ele deve conter uma certa “flexibilidade” para que não sejam desperdiçados dados relevantes que possam surgir durante a entrevista. Por outro lado, esta flexibilidade não deve corresponder a uma ausência de direcionamento e objetividade, pois se corre o risco de não obter dados relevantes e consistentes que permitam reproduzir o objeto de estudo. Ainda que com uma postura “flex ível”, o pesquisador deve dirigir, controlar e orientar todo o processo, mesmo quando tenta deixar os entrevistados à vontade.

Lembre-se que a entrevista não está num campo supostamente neutro da coleta de dados. O momento da entrevista é, também, marcado por conflitos, contradições e tensões. Tentem criar uma atitude simpática e um ambiente em que, sem a pretensão de neutralizar ou negar tais contradições, estas não prejudiquem ou impactem negativamente a coleta dos dados. Para tal postura, são atitudes fundamentais a abertura, a flexibilidade, o dinamismo, a capacidade de observação e de interação.

A realidade não é apreendida de maneira imediata, por isso é necessário que o pesquisador esteja adequadamente preparado para tentar reproduzi-la. Esta preparação supõe o uso consciente e preciso da técnica da observação. Observar é diferente de ver. Não é raro encontrar pesquisadores que vêem muito e problematizam pouco. A observação atenta e rigorosa além de não se limitar à mera constatação de dados, demanda o uso de procedimentos de ordem técnica, metódica e sistemática, complementando os sentimentos do pesquisador em relação aos fenômenos investigados.

Junto com a observação, deve-se proceder ao registro fiel do que foi observado e identificado como dado relevante, e é neste momento que o diário de campo mostra a sua importância para o trabalho de coleta de dados. Para que você não fique refém de sua memória, elabore-o imediatamente, com o máximo de atenção e detalhamento possível. Nele devem ser registradas todas as informações que não sejam a gravação das entrevistas formais, incluindo-se: observações, conversas informais, comportamentos, comentários, gestos, expressões, formas de organização do trabalho, existência de recursos tecnológicos, computadores, uso que deles é feito, posturas favoráveis ou não, falas, enfim, tudo aquilo que possa nos ajudar a entender nosso objeto de estudo.

A partir destas considerações iniciais, sugiro algumas orientações de ordem prática para subsidiar o trabalho dos pesquisadores em campo. São sugestões que, espera-se, possam aprimorar a complexa e fascinante “aventura” que é o trabalho de campo.

1 - Observe atentamente o ambiente e o contexto em que se dará da entrevista. Comentários, formas de organização, posturas, conversas, manifestações informais etc. podem conter dados preciosos.

2 - Ao escolher o local para a entrevista tome cuidado com o barulho ou ruído excessivo; além de atrapalhar o entrevistado e o entrevistador, dificulta o processo de transcrição. Utilize o gravador de forma a obter o máximo de qualidade sonora: ruídos, pessoas falando ao mesmo tempo, sobreposição de vozes, distância do microfone, etc. dificultam em muito a etapa de transcrições de áudio.

3 - Ao abordar o entrevistado, identificar-se e informar os objetivos da pesquisa, sem apresentar as hipóteses ou pressupostos, pois isso pode interferir nas respostas do entrevistado.

4 - Apresentar ao entrevistado o termo de consentimento, se necessário ler em conjunto, como uma formalização das condições de sigilo e preservação da identidade.

5 - Explicar com atenção e cuidado a necessidade da gravação. É um recurso para não deixar que os dados se percam. Em hipótese alguma haverá identificação do entrevistado. O entrevistado não tem que se sentir intimidado pelo gravador, pode responder com calma, pensar, refletir.

6 - Iniciar a entrevista com um pequeno trecho de abertura, informando o início da entrevista, a data, local, hora, e outras informações relevantes. Evite “começar do nada”.

7 - Evite ler as perguntas, simplesmente. Tente apresentá-las de forma mais “personalizada”. Não há problemas em repetir a questão. Se você perceber que a resposta dada pelo entrevistado não corresponde à pergunta realizada, reformule-a. Tome apenas o cuidado de não pressionar o entrevistado, fazendo-o se sentir acuado, “contra a parede”.

8 - Não ofereça qualquer tipo de “ajuda”, comentário positivo ou negativo para a resposta do entrevistado. Posturas como balançar a cabeça, como se estivesse concordando ou discordando, olhares enfáticos ou manifestações de riso ou espanto podem impressionar e interferir na resposta do entrevistado.

9 - Evite ficar nervoso, pois essa postura pode afetar o comportamento do entrevistado. Tente conduzir a entrevista da forma mais serena possível, deixando o entrevistado a vontade para responder de forma tranqüila, sem pressa ou nervosismo.

10 - Explicar que não há resposta “correta”, por isso o entrevistado não precisa se preocupar em responder “errado”. A pesquisa incide justamente sobre as impressões e considerações que os profissionais possuem.

11 - Há um roteiro geral para a entrevista, que pode ser mostrado ao entrevistado, caso ele solicite. O instrumento específico para realização da entrevista é de uso exclusivo do entrevistador.

12 - Ao término da entrevista, após os comentários e considerações finais do entrevistado, não pare a gravação de forma abrupta. Registre a sua finalização, com hora e data.

13 - O entrevistado tem o direito de solicitar uma cópia da entrevista ou da transcrição. Caso ele a solicite, informe que o mesmo será enviado dentro de um prazo de duas semanas, para que tenhamos tempo hábil para a transcrição do áudio.

14 - Ao término da entrevista, agradecer ao entrevistado pelo tempo e atenção. Informar que a equipe da pesquisa está à disposição para dúvidas ou sugestões. Informar ainda que após a fase de coleta de dados, a equipe da pesquisa voltará à instituição para dar o retorno das informações geradas a partir das entrevistas.

15 – Elabore imediatamente o diário de campo para que a riqueza presente nas informações e dados observados não se perca.

Rio de Janeiro, outubro de 2010.